Amado porquinho Neném

Pet  Carinho lendo um livro em sua casa acompanhada de dois de seus cachorros

Pet Carinho estava em casa. Não era dia de seu plantão na ASP. Ela havia dado aula pela manhã e almoçara em um restaurante vegetariano próximo ao seu local de trabalho. Depois disso, foi para sua casa, no Recanto Natureza Feliz, e resolveu dar uma conferida no novo material didático que iria utilizar com seus alunos no ano letivo que se iniciava. 

No dia anterior, ela havia resgatado mais três cachorros e dois gatos de maus tratos. Seu coração doía quando via que o abandono de animais continuava acontecendo e em certas épocas do ano como Natal e Carnaval, o número de pets jogados nas ruas aumentava ainda mais. 

Sentada no seu sofá, lendo, acompanhada de dois de seus cachorros, ambos também resgatados por ela, Pet, ou a professora Luiza como era chamada na escola em que lecionava (para os alunos, tia Luiza), refletia sobre tudo isso. 

Fechando o livro e o colocando sobre a mesa, ela resolveu tomar um banho, para depois tentar descansar um pouco.  

Tixinha, a lagartixa "adotada" por Pet Carinho, que vive em seu banheiro

Antes de ligar o chuveiro, ela viu Tixinha no vidro da janela e conversou um pouquinho com ela. Tixinha era uma lagartixa que vivia no banheiro de Pet fazia um bom tempo. Ficava lá, na dela, caçando mosquitinhos e não fazia mal a ninguém. Pet deixava o parapeito da janela propositalmente molhado com gotinhas de água fresca, para que a sua amiguinha bebesse água. Pet respeitava todos os seres da natureza, e a natureza em si, tal qual ela é. 

Ao sair do banho, Pet foi direto pro seu quarto. Ia vestir uma roupa bem larga e confortável e assistir um pouco de TV quando ouviu seu celular tocando insistentemente. Não queria atender, mas sua intuição nunca falhava e ela sentiu que poderia ser algo urgente. Poderia ser da ASP, algum animal poderia estar precisando de seu socorro. E ela estava certa!


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A garotinha Mabel chora porque não quer se separar de seu porquinho de estimação, Neném.

Na ASP, Mizuki, a Maria Recicla-tudo, ligava insistentemente para Pet Carinho, enquanto seu companheiro de plantão, Zeca Ar Puro, ligava para João do Bom Chicote. Esse era um caso para um dos dois, ou de preferência, para os dois juntos, se ambos pudessem estar disponíveis naquele momento para colaborar. Afinal, Pet é a protetora dos pets (ou animais familiares, de estimação, domésticos) como cachorros, gatos, coelhos, etc, e Joãozinho é o protetor dos animais considerados "gado", seja de corte, seja de leite, além dos que puxam carroças e são usados a serviço do homem.

O motivo de todo esse empenho em encontrar Pet e Joãozinho, foi um telefonema muito comovente que fora atendido por Mizuki. Uma garotinha de apenas seis anos de idade, em pratos e falando bem baixinho, contara sua história:

Mabel era o nome dela. Até pouco tempo atrás, ela morava com os pais e tios num sítio pequeno e aconchegante, numa cidadezinha do interior do Rio de Janeiro. Seu pai havia arranjado um emprego na capital e ela estava muito triste de ter que se mudar. No seu aniversário de seis anos, comemorado com festa em um domingo, ela ganhara um presente maravilhoso, mas inusitado: um porquinho rosinha e muito fofo, que ela amou no mesmo momento em que o viu! Deu-lhe o nome de Neném. Na semana seguinte, ela nem se lembrou de suas bonecas, só queria brincar com o Neném.

Quando seus pais disseram que ela teria que deixá-lo no sítio, Mabel chorou muito, mas concordou. No dia da mudança para o Rio, ela se despediu de Neném aos prantos. Os pais prometeram que ela iria sempre poder visitá-lo. Só que ela queria mesmo era buscá-lo para viver com ela. Mas como levar um porquinho para viver num apartamento? Os pais e tios haviam explicado que isso era impossível, mas ela não desistiria nunca!

O tempo foi passando, e nos finais de semana, Mabel não abria mão de ir ao sítio ver seu porquinho, além de seus tios, é claro. Neném foi ficando maior, e mais gordo. Um dia, na hora do jantar, a tia de Mabel, Jane, comentou que Neném não demoraria a estar no ponto certo para virar um jantar delicioso e perguntou a Mabel que data ela escolheria para comer o Neném! “Você vai ver, querida, o seu porquinho vai dar o pernil mais gostoso que você já comeu!” A tia não falou por mal. Na cabeça dela isso era algo natural, "afinal, os porcos só existem com uma finalidade: serem comidos". Mas a menina saiu da mesa chorando desesperadamente e foi para o seu quarto. Não conseguiria mais ficar tranquila sabendo que Neném estaria no sítio com aquela tia que queria matá-lo logo que ele engordasse apenas mais um pouco.

Mas Mabel tinha um segredo: ela havia anotado o telefone dos Super Protetores dos Animais (ou SUPRO) e resolveu que assim que chegasse ao Rio, ligaria para eles escondido, pedindo ajuda. E assim aconteceu. Sua mãe, Marilia, estava tentando consolá-la, explicando que os porcos existiam para servir de comida para o ser humano. Mas a menina não concordava com isso! Ela amava Neném e não queria que ele sofresse nem que virasse comida. 

Segunda-feira ao anoitecer, Mabel esperou sua mãe ir para a cozinha para preparar o jantar e antes que seu pai, Jair, chegasse do trabalho, foi até a sala, pegou o telefone e ligou para a ASP, falando bem baixinho, para que Marília não ouvisse. Seus pais sabiam dos Super Protetores e admiravam o trabalho deles, mas ela tinha medo de que eles se zangassem por ela os estar metendo em um assunto de família. Mabel era muito fã desses heróis, e Marine Água Azul era sua preferida, porque ela se achava um pouco parecida com ela e queria ser uma SUPRO quando crescesse!

E assim, quando Pet atendeu seu celular, Mizuki a pôs a par de todo o drama de Mabel e todo o seu desespero, afinal, seu porquinho de estimação, a quem muito amava, estava correndo risco de vida e ela iria sofrer muito se ele morresse. Mizuki prometera à menina que os SUPRO não permitiriam que isso acontecesse. 

Sem titubear, após anotar o endereço, Pet desligou o celular, vestiu seu uniforme, subiu em seu tapete voador, e seguiu em direção à cidadezinha onde Neném morava.


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Pet Carinho, já de uniforme, pronta para ir ajudar a menina Mabel e seu porquinho Neném

Enquanto isso, no sítio, a tia de Mabel conversava com o marido, Paulo, durante o jantar:

- A Mabel nunca vai querer comer o porco dela – disse tia Jane.

- Eu sei. É melhor a gente vender esse porco.

- Ou a gente mata logo, antes que a Mabel volte aqui. A gente diz que ele fugiu ou que alguém o roubou. O que não podemos é ficar com esse porco engordando até explodir, porco foi feito pra gente comer! E ele já está bem gordinho. Vai dar muito toucinho!  Ia ser um desperdício de carne se a gente deixasse ele morrer de gordo.

- Lá isso é verdade. Amanhã acordo cedo e dou cabo dele. Comemos ele durante a semana e quando a Mabel vier, no sábado, já não vai ver nem uma sobrinha dele, e assim, ela não vai desconfiar de nada.

- Eu posso mandar um pouco de carne, banha e linguiça pra comadre Inácia e também pro Sr. Raimundo aqui do lado. Assim acaba mais rápido.

Neste exato momento Pet Carinho chegava ao sítio em seu tapete voador. Ela desceu correndo e foi direto na direção das vozes que ouvia. Elas vinham da sala de jantar. A SUPRO dos pets chegou na janela bem de mansinho, sem ser vista e conseguiu ouvir a última frase dita por tia Jane, que foi o suficiente para que ela entendesse tudo.

“Vão matar, comer e distribuir parte da carne do porquinho da menina! Chega logo, Joãozinho, tomara que o seu cavalo Joca hoje esteja ainda mais veloz!”.

E a conversa continuava...

- Boa ideia, Jane. Vamos dar um pouco da carne pros vizinhos e acabar logo com isso. Onde já se viu, porco de estimação! Por que ela não arranja um cachorro ou um gato?

- Não foi ela que arranjou, Paulo. Ela ganhou de aniversário de uma amiga da Marília.

- É mesmo. Mas que amiga mais maluca essa, vê se pode uma coisa dessas! Dar um porco de presente pra uma criança!

E o casal caiu na gargalhada enquanto Jane se levantava da mesa e recolhia os pratos e talheres, levando-os à cozinha seguida do marido que a ajudava recolhendo as travessas e os copos.

Pet saiu da janela da casa e foi ao chiqueiro ver Neném, o único porco que havia ali. “Ele é lindo, igualzinho a Mabel o descreveu para a Mizuki”, pensou Pet consigo mesma acariciando o porco e fazendo-o dormir um soninho bem tranquilo. E assim, ela se sentou em um banco de madeira que havia ali perto para esperar pela chegada de João do Bom Chicote.

Uma hora depois surgiu João, montado em seu cavalo Joca, que era o mais veloz do mundo! Ele deu um pulo do cavalo e veio correndo em direção à Pet. Durante a viagem viera bolando um plano e estava ansioso por contá-lo à sua grande amiga e companheira de causa.

- Pet! – gritou ele

- Shhhh! Fala baixo, desse jeito você vai acordar todo mundo!

- Eu já sei o que nós vamos fazer – disse ele baixando a voz.

- Eu bem que imaginei que você, como sempre, já chegaria com plano e tudo! Conta logo, qual é a sua ideia?

- É muito simples, vamos raptar o porquinho!

- Você tá doido?

- Você tem uma ideia melhor?

- Eu vim pensando em conversar com eles, mas...

- Mas...

- Mas pelo que eu ouvi da conversa deles, não vai adiantar nada. Eles não vão entender. Nas cabeças deles, porcos são feitos unicamente pra servirem de alimento. Se formos tentar convencê-los do contrário é bem capaz de nos expulsarem daqui a pontapés e ainda matarem o porquinho na mesma hora! Você poderia usar o seu chicote neles, mas quando o efeito passasse, eles iriam acabar matando o porco mais cedo ou mais tarde! E enquanto isso a menina não ia ter mais tranquilidade, afinal, nem ela e nem nós estaríamos por perto pra vigiar a todo momento. Nem teríamos como.

Pet pensou por uns rápidos instantes, e então, se levantando, resoluta, decidiu:

- Vamos ao seu plano! Vamos raptar o Neném! E levá-lo ao santuário mais próximo, que sempre nos ajuda quando precisamos.

E assim foi feito. Pet colocou Neném em um sono ainda mais profundo, e com a ajuda de Joãozinho, o deitou em seu tapete voador, com todo cuidado e o carinho que lhe é característico. 

- Eu vou na frente avisar ao pessoal do santuário - disse João, já montando em Joca e disparando pela estrada.

Pet já ia se sentando no seu tapete, pronta pra levantar voo, quando viu que as luzes da casa haviam se acendido. O casal, provavelmente, havia acordado com o barulho do trote do cavalo de Joãozinho. Paulo, o tio de Mabel, apareceu na varanda com uma espingarda na mão.

- Quem é? Pare aí agora se não quiser levar um tiro!

Pet se assustou com a ameaça mas sua coragem e o firme propósito de salvar a vida de Neném a fizeram enfrentar o homem de frente.

- Eu sou a Pet Carinho, sou uma Super Protetora dos Animais. Fiquei sabendo do caso do porquinho Neném e estou levando-o. 

- Mas você não tem esse direito. Eu vou chamar a polícia! Isso é roubo!

Nisso, Jane, vestindo um quimono por cima da camisola surgiu ao lado do marido.

- O porco é nosso, você não pode levá-lo! - gritou ela.

- O porco é da sobrinha de vocês! E vocês é que iriam agir de maneira errada e desonesta ao se apropriarem dele sem a autorização dela. E mais: queriam matá-lo!

- Ora, ora, moça. Porcos são feitos para...

- Para viverem e serem muito bem tratados e felizes! E sem mais, estou indo.

- Espere - gritou Paulo - Você não pode fazer isso! E vai levá-lo pra onde? A Mabel vai ficar furiosa!

- Não vai não. Furiosa ela ficaria se chegasse aqui e não encontrasse o seu porquinho, a quem ela tanto ama!

- Espere aí! A Mabel está sabendo disso?

Enquanto essa discussão ocorria entre seu marido e a Super Protetora, Jane, de celular na mão, ligava para Marília, a mãe de Mabel. Esta acordou assustada, e mais chocada ainda ficou ao saber o motivo para aquele telefonema em uma hora tão imprópria. Correu até o quarto da filha e pediu satisfações. A essa altura, Jair, seu marido, também já tinha acordado e apareceu ao seu lado, aturdido, esperando que Mabel, em prantos, sentada em sua caminha cor-de-rosa, começasse a explicar o que estava acontecendo.

A garotinha, com dificuldade, e entre soluços, contou tudo a seus pais. E implorou que eles deixassem a Pet Carinho levar Neném embora do sítio. 

Jair e Marília já estavam quase convencendo a menina de que seria melhor deixar Neném no sítio dos tios mesmo e, quando fossem lá, no final de semana, eles conversariam com Jane e a fariam mudar de ideia, desistindo de matar Neném. Mabel não se sentia nada segura com essa ideia, mas ela tinha que obedecer seus pais.

Nesse exato momento, porém, o celular de Marília toca novamente. Ela atende e não consegue esconder o embaraço. Dessa vez é Pet Carinho em pessoa. 

A SUPRO havia se aproximado de Jane enquanto esta ainda falava com Marília e quando a ligação foi encerrada, pediu educadamente o celular para que visse o número. E então, usando seu próprio celular, Pet ligou para a mãe de Mabel e contou a conversa que ouvira da janela da sala de jantar, dizendo que não havia mais tempo a perder. Marília ficou chocada e bem decepcionada com os parentes, pois além de apressarem a morte do porquinho, ainda mentiriam para sua filha, e pelo jeito, para eles também. 

Pet Carinho odeia fofocas, mas nesse caso, era necessário que a verdade fosse dita de maneira completa e direta, pois havia uma vida em jogo. Na verdade duas, pois Mabel poderia até adoecer caso Neném "desaparecesse" repentinamente do sítio de seus tios. 

Pet já estava desligando o celular quando Paulo, irritado, começou a caminhar a passos largos em direção ao tapete onde estava Neném. Pet correu e parou em sua frente.

- Pare agora mesmo, senhor Paulo. Se não me obedecer ficará marcado para sempre como uma pessoa que maltrata animais!

- Ora essa, o que você quer dizer com isso, sua Mulher Maravilha de óculos?

- Eu farei aparecer uma marca na sua mão e é uma marca que nunca mais sumirá, não importa o que o senhor faça!

Paulo parou, meio incrédulo. Jane então falou:

- É verdade, Paulo. Eu já li sobre esses SUPRO. Eles têm mesmo esses poderes esquisitos, parece até coisa de bruxaria.

- Não é bruxaria. Mas isso agora não vem ao caso. Estou levando o Neném e não ousem se aproximar!

Pet Carinho fez o tapete voador se erguer no ar. Jane e Paulo olhavam boquiabertos. De repente, tomado de fúria, Paulo atirou para o alto sem pensar muito. Foi um gesto inconsequente, pois poderia ter acertado Pet. Mas acabou acertando Neném.


Paulo, ao lado de sua esposa, Jane, observa horrorizado a marca que Pet Carinho fez aparecer em sua mão direita

O porquinho acordou com seu próprio grito. Fora atingido bem no lombo. Pet esticou a mão com um gesto em direção a Paulo. No mesmo instante as costas de sua mão direita recebeu uma marca saliente que dizia "Protejam seus animais de mim, pois sou um perigo para eles".

- Você perdeu o juízo, homem. Ela avisou! - disse Jane olhando a marca na mão do marido.

Enquanto Paulo urrava de raiva, Pet acelerava em seu tapete, se preparando para descer num lugar próximo, e seguro.


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Neném, feliz e protegido no santuário onde é visitado quase que diariamente por Mabel e também por Pet Carinho

Pet estacionou seu tapete com o porquinho ferido em um terreno baldio e gramado. No mesmo instante adormeceu novamente Neném e usou o seu poder de cura para extrair a bala e fazer a ferida fechar e cicatrizar. Pronto, Neném estava curado e em segurança! Pet levantou voo em direção ao santuário.

Chegando lá, Joãozinho a esperava com tudo pronto para receber Neném com todo conforto, e assim, o porquinho foi colocado num abrigo muito aconchegante, que passaria de agora em diante, a ser a sua caminha. Pet contou ao amigo aspeiro o porquê da demora e explicou tudo que havia acontecido. Para não incomodar de novo a família de Mabel, com telefonemas àquelas horas da madrugada, eles optaram por enviar uma mensagem de áudio via whatsapp avisando que Neném já estava a salvo no santuário onde ficaria morando.

No dia seguinte pela manhã, lá estava Mabel, radiante, com seus pais, chegando ao santuário. Ao vê-la, Neném correu em sua direção e Mabel o abraçou e beijou, chorando. Mas agora, as lágrimas eram de felicidade e gratidão! Ela iria ver Neném todos os dias, sempre que possível. E se seus pais um dia pudessem alugar ou comprar uma casa, ela iria levá-lo para morar com ela. E mais: ela só se casaria com um marido que aceitasse o Neném! Estava decidido!

Enquanto tudo isso passava pela cabeça de Mabel, ali abraçadinha com Neném diante dos olhares emocionados de seus pais, Pet e João chegavam em suas casas para dormirem o sono dos justos. Não aguentaram esperar por Mabel. Uma outra hora se encontrariam com ela ali no santuário ao visitarem Neném. Mas bastava de emoções fortes por aquele dia. Já haviam enviado áudios para os amigos aspeiros contando os acontecimentos. Agora, o compromisso de ambos era apenas com Morfeu, o deus dos sonhos!


FIM

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